Por Katharine Sanderson, The New York Times News Service/Syndicate
Você comeria caviar e chocolate branco em um mesmo bocado de comida? A resposta pode depender da região do mundo onde você mora.
Nas culinárias da América do Norte e da Europa ocidental, os chefs tendem a combinar alimentos que compartilham compostos aromáticos. Assim, os mais aventureiros podem servir até mesmo caviar e chocolate branco, porque ambos têm trimetilamina, entre outros compostos. Mas os chefs asiáticos operam de forma diferente, de acordo com um trabalho recém-publicado na revista Scientific Reports pelo físico teórico Sebastian Ahnert, da Universidade de Cambridge, no Reino Unido, e seus colegas.
Ahnert, ele próprio um gastrônomo molecular amador, ficou intrigado com a sugestão informal de que a razão pela qual alguns alimentos combinam bem é porque eles contêm moléculas de mesmo aroma. Ele e sua equipe, portanto, desenvolveram redes para ligar compostos aromáticos com os ingredientes encontrados em bancos online de receitas, sendo um coreano e dois americanos, classificando as receitas de acordo com a região de onde são originárias: América do Norte, Europa Ocidental, América Latina, Sul da Europa e Leste Asiático.
Ele descobriu que aquela ideia informal parece se confirmar em receitas da América do Norte e da Europa Ocidental. Por exemplo, a receita do prato norte-americano de lagostim e tomate grelhado tem, em seus dois principais ingredientes (lagostim e tomate), o 1-penteno-3-ol, e a mussarela, o parmesão e o tomate usados na preparação do prato todos compartilham o ácido 4-metilpentanóico.
Porém, nas receitas da Ásia Oriental e do Sul da Europa, a tendência foi oposta – os ingredientes se mostraram menos propensos a compartilhar compostos aromáticos.
A equipe também descobriu que alguns ingredientes comuns das receitas da América do Norte – leite, manteiga, cacau, baunilha, creme de leite e ovos, por exemplo – compartilham compostos aromáticos com muitos outros alimentos. Assim que esses alimentos foram excluídos da análise, o grau de compartilhamento de aromas teve uma queda. Por outro lado, no caso da cozinha do leste asiático, quando a equipe removeu os ingredientes mais comuns que compartilhavam o menor número de compostos aromáticos (carne bovina, carne de porco, gengibre, pimenta-caiena, frango e cebola) na análise, o grau de compartilhamento de aromas nos ingredientes restantes aumentou.
Essas descobertas apontam para outro fator que está em jogo nas culinárias asiáticas e que ainda não foi identificado, diz Ahnert. “Claramente, é algo diferente do compartilhamento de compostos”, diz ele. “Para que tenhamos uma ideia mais clara do que está acontecendo, eu quero analisar dados melhores sobre compostos aromáticos”. Ele, portanto, entrou em contato com os proprietários de bancos de dados profissionais para descobrir a quantidade de cada composto aromático que está presente em cada ingrediente. Ele também quer verificar se os ingredientes com gostos – ou até mesmo cheiros – semelhantes, mas sem os mesmos compostos aromáticos, são utilizados em conjunto.
Outras pesquisas sobre ingredientes e receitas têm sido realizadas. Na Universidade de São Paulo, Antônio Roque e seus colegas compararam os ingredientes de várias receitas para detectar quais foram mais os comuns, e descobriu que alguns prevaleceram por causa de sua presença em uma cultura particular ao longo da história.
“Acho que (o trabalho de Ahnert) tem mais potencial para inspirar aplicações culinárias práticas que o nosso, porque propõe uma forma de construir redes de aroma – e a culinária baseada em aromas se tornou popular nos últimos anos”, diz Roque, que acrescenta que ambos os estudos destacam a utilidade da análise de redes em áreas que não utilizam tradicionalmente tais métodos.
Ahnert concorda. Ele acha que sua análise pode identificar novas combinações de sabores que poderiam se dar bem juntas – pelo menos para alguns paladares.
Quanto aos aromas não correspondentes que apareceram na pesquisa das culinárias asiáticas, alcançar esse objetivo vai exigir mais trabalho. “Há muitas explicações”, diz Ahnert, incluindo razões culturais profundamente enraizadas como justificativa para que certos ingredientes sejam combinados.
Até lá, Ahnert voltará aos seus dados, e também à cozinha, onde está ansioso para experimentar as combinações aromáticas que apareceram durante a sua análise. Em particular, ele quer combinar café e alho. Afinal, diz ele, o café é usado com frequência para substituir caldos em geral. No entanto, pode ser que leve um tempo até que as lojas de café fiquem convencidas de que servir uma dose de alho com um cappuccino é uma boa ideia.