A Budweiser estendeu seu contrato multimilionário de patrocínio até 2022. Fica ainda mais improvável manter a proibição às cervejas nos estádios brasileiros
Garrafa de cerveja da marca americana Budweiser, do grupo belga-brasileiro InBev (Spencer Platt/Getty Images)
Executivo da InBev, também comemorou o acerto – e deixou claro que o patrocínio à Copa não é só uma questão de promoção da marca, mas também de venda de cervejas aos torcedores.
A chance de o Brasil aprovar uma Lei Geral da Copa que não inclua uma autorização para a venda de bebidas alcoólicas nos estádios durante o Mundial ficou ainda menor nesta terça-feira. Pouca gente ainda achava que a Fifa aceitaria ceder e manter em vigor a proibição ao consumo de álcool nos estádios brasileiros da Copa. Um anúncio oficial feito pela entidade tornou essa hipótese ainda mais distante da realidade. De acordo com a Fifa, o grupo belgo-brasileiro Anheuser-Busch InBev renovou seu contrato de patrocínio para a Copa do Mundo, estendendo sua parceria com a Fifa por mais de uma década. A marca americana Budweiser, um dos produtos globais da empresa, já era a cerveja oficial da Copa de 2014, no Brasil. Agora, a marca está garantida também nos Mundiais de 2018, na Rússia, e 2022, no Catar.
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A renovação do contrato reduz a chance de exclusão das cervejas Budweiser dos estádios brasileiros na Copa porque sinaliza o tamanho do investimento feito pela empresa no evento. Considerada um dos parceiros comerciais mais importantes da Fifa, a InBev paga cerca de 25 milhões de dólares por ano à entidade no atual contrato. O valor do novo acordo não foi revelado, mas certamente torna inviável que a Fifa promova uma Copa do Mundo sem garantir à Budweiser um espaço de destaque nos estádios da Copa. A Bud foi patrocinadora oficial do torneio pela primeira vez na Copa do México, em 1986. A marca é a primeira a renovar seu contrato com a Fifa para os Mundiais de 2018 e 2022. E as declarações de Jeróme Valcke, o secretário-geral da entidade, deixam claro o tamanho do compromisso da Fifa com seus parceiros.
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No anúncio do acerto com a InBev, o braço-direito de Joseph Blatter afirmou que está “ansioso para trabalhar em cooperação com os patrocinadores até 2022 e até depois disso”. “Desde que se juntou à nossa família de patrocinadores, a Budweiser teve um papel vital no desenvolvimento da Copa do Mundo como grande evento”, disse o francês. Chris Burggraeve, executivo da InBev, também comemorou o acerto – e deixou claro em suas declarações que o patrocínio à Copa não é só uma questão de promoção da marca, mas também de venda de cervejas aos torcedores. De acordo com ele, a Copa é um “momento chave de comemoração e consumo de cerveja”. Com exceção de uma das sedes da Copa da Alemanha, todos os estádios das últimas Copas do Mundo só podiam vender cerveja da marca Budweiser.
O cabo-de-guerra entre a Fifa e o governo
A Lei Geral da Copa é cercada de controvérsias. Veja o que está em jogo na discussão do texto
Bebidas alcoólicas nos estádios
Por que é um problema: Conforme o Estatuto do Torcedor, é proibido vender qualquer tipo de bebida alcoólica nos estádios. Incapaz de conter a violência das torcidas e de fiscalizar a venda de álcool a menores de idade, o Brasil teve de adotar uma proibição que não existe nos países desenvolvidos, onde apenas o consumo excessivo é alvo de punições nos grandes eventos esportivos.
Por que a Fifa não quer ceder: Uma dos principais patrocinadoras da Copa do Mundo é a marca de cerveja Budweiser, do grupo belga-brasileiro InBev. Parceira da Fifa nos Mundiais desde 1986, a cerveja americana paga cerca de 25 milhões de dólares por ano para ter sua marca ligada ao torneio. Por contrato, a Budweiser tem de ser a única cerveja à venda nos estádios da Copa.
O que pode acontecer: A Lei Geral da Copa deverá permitir temporariamente a venda de bebidas alcoólicas durante o torneio. Como as partidas da Copa são cercadas por um rigoroso esquema de segurança – e como boa parte do público será formado por torcedores de países em que o consumo de cerveja nos estádios é permitido -, o risco de que essa mudança provoque problemas é pequeno.
Meia-entrada a estudantes e idosos
Por que é um problema: Bandeira histórica da UNE, que já foi presidida por Orlando Silva, o direito a ingressos pela metade do preço para estudantes é garantido por uma lei federal. No caso dos maiores de 65 anos, o benefício é assegurado pelo Estatuto do Idoso. Nas Copas, porém, a Fifa costuma ter controle total sobre as entradas, desde seus preços até gratuidades e descontos.
Por que a Fifa não quer ceder: De acordo com cálculos feitos pela própria entidade, a venda de meia-entrada aos estudantes e idosos provocaria uma perda equivalente a 100 milhões de dólares durante a Copa de 2014. O preço médio de um ingresso de Mundial foi de 135 dólares nas duas últimas edições do torneio. Com a meia-entrada, esse valor médio poderia despencar para 70 dólares no Brasil.
O que pode acontecer: A Fifa já descartou a possibilidade de aumentar os preços dos outros ingressos para compensar as perdas com a meia-entrada, mas não abre mão da prerrogativa de definir os preços dos bilhetes. A saída mais provável é uma negociação que garanta algum tipo de desconto aos estudantes e idosos – nesse caso, a Lei Geral da Copa suspenderia a vigência da meia-entrada nos jogos do Mundial.
Combate e punição à pirataria
Por que é um problema: A má fama do Brasil no quesito proteção à propriedade intelectual fez com que a Fifa cobrasse penas mais rigorosas para quem piratear as marcas da Copa do Mundo e vender produtos não-oficiais. Hoje, o crime de pirataria é punido com um a três meses de prisão. A Fifa quer que os piratas peguem pena de no mínimo três meses e no máximo um ano de prisão.
Por que a Fifa não quer ceder: A venda de produtos licenciados e oficiais é uma das grandes fontes de receita da entidade durante a Copa. A venda de produtos pirateados é uma ameaça dupla para a Fifa – além de perder dinheiro por causa da concorrência ilegal, ela corre o risco de perder parceiros comerciais para as próximas edições. Por isso, a perseguição as piratas precisa ser impiedosa.
O que pode acontecer: Como a punição à pirataria está descrita no Código Penal, alterar as penas previstas para os falsificadores pode ser uma jogada controversa. A alternativa pode ser negociar uma estratégia mais rigorosa e eficaz de prevenção do uso irregular da marca da Copa. A Lei Geral da Copa poderá listar todos os tipos de produtos que não poderão trazer qualquer referência ao Mundial, mas sem alterar as penas em vigor no país.
Criação de tribunais de exceção
Por que é um problema: Um dos mais delicados temas da Lei Geral da Copa, a instalação de juizados especiais, varas, turmas ou câmaras especializadas para analisar casos ligados à Copa é, de fato, uma proposta que causa estranheza nos países que recebem o evento. Com esses dispositivos temporários, os julgamentos ocorreriam através de regras que fogem ao sistema comum da Justiça.
Por que a Fifa não quer ceder: Na essência dessa proposta está o desejo da Fifa de resolver rapidamente qualquer disputa relacionada à Copa. A entidade teme chegar ao fim do evento com processos não julgados, que correrão no ritmo dos tribunais locais. Na África do Sul, por exemplo, torcedoras holandesas que fizeram propaganda de uma cerveja concorrente da Budweiser foram detidas, julgadas e excluídas do evento.
O que pode acontecer: O governo terá de encontrar uma forma de cumprir as exigência sda Fifa sem ferir a segurança jurídica do país. Uma possível estratégia que já está sendo estudada: escalar a Advocacia Geral da União (AGU) para acompanhar a atuação dos tribunais – que terão apenas magistrados brasileiros – e, assim, garantir que os preceitos básicos da legislação local sejam seguidos.