Amigas há 20 anos, Marie e Karla se reuniam na casa da primeira e se dividiam entre os computadores para pesquisar sites de história dos mais variados países. Karla afirma que, no início, a dupla ficou tão imersa nesse universo de pesquisa que chamou a atenção do filho mais velho de Marie, Mateus, de nove anos. “Ele ficava muito impressionado com a nossa quantidade de trabalho. Foi aí que tivemos ideia de pedir a ele para desenhar como ele imaginava que seria o rei Augusto [personagem do Carmo Dalla Vecchia]”, conta
As figurinistas contam que a iniciativa de pedir ao menino para que ele imaginasse um rei partiu da conversa que elas tiveram com o diretor de núcleo Ricardo Waddington e a diretora-geral Amora Mautner. “A encomenda do Ricardo e da Amora para a gente foi encontrar o rei no imaginário coletivo. Até porque, por mais que a novela tenha como fio condutor os anos de 1890 e 1900, ela é uma fábula. E, como tal, nos dá uma certa liberdade criativa”, argumenta Marie.
Aliás, Karla explica que todas as peças da novela – de todos os núcleos – são artesanais. “As peças de todos os 55 personagens da história sofrem intervenções. Tudo passa pela mão de uma bordadeira, ou é tingido, envelhecido. A roupas da Ternurinha [Zezé Polessa], por exemplo, passam por, pelo menos, duas bordadeiras”, explica.
Karla emociona-se ao lembrar de quando as bordadeiras criaram o vestido de noiva para a princesa Carlota [Luana Martau]: “O vestido é todo bordado. Deu um trabalho e tanto para as bordadeiras. Quando a Luana veio fazer a prova, todo pessoal da costura e do bordado parou de trabalhar para vê-la experimentando o vestido. As bordadeiras ficaram emocionadas. Foi uma comoção”.
Uma das maiores dificuldades que Marie e Karla enfrentaram na hora de criar o figurino de Seráfia do Norte foi encontrar o material para a gola e a dragona do rei Augusto. “Só conseguia imaginar o metal. Fomos a um monte de ferro velho, fui a uma feira no Bixiga, em São Paulo, atrás de uns puxadores de porta. Mas nada ficava bom. Na hora que bordávamos no manequim, caía. Era pesado demais. Até que a Karla descobriu um menino que trançava metal numa feira aqui no Projac [complexo de estúdios da Globo]. Conseguimos, então, o que procurávamos”, recorda Marie, afirmando que as dificuldades não pararam por aí: “Aí começamos a busca pela cor. Porque existem vários tipos de ouro. Só que no alumínio não pega. Então dá um trabalho danado. Porque temos que colocar uma química, depois banhar de ouro. Enfim, é tudo artesanal”.
Para o figurino de Seráfia do Sul, Marie e Karla optaram pelas cores prata, azul marinho e preto. “Seráfia do Sul é o meu xodó”, entrega Karla. Todo feito à mão, o figurino de Brogodó também não fica atrás na preferência da figurinista. “Brogodar virou verbo para a gente. Significa acrescentar o feito à mão. Por isso dizemos que demos uma brogodada no figurino”, diverte-se.
Com tons claros e materiais naturais, como a juta e o algodão, o visual brogodense recebe aplicações de madeira, sementes, palha e coco. “As toalhas de mesa viraram vestidos para os personagens de Brogodó”, conta Karla, acrescentando que o povo brogodense usa muitas peças com crochê, renda filé e patchwork.
Já para as peças usadas pelos cangaceiros, Marie e Karla foram buscar inspiração nos guerreiros como os samurais, por exemplo. Marie conta que descobriu um menino no Ceará que faz artesanato em couro. “A cultura do artesanato em couro é muito forte no Ceará, passa de pai para filho. Conheci o trabalho desse menino e achei perfeito para a novela. Aí começamos a montar esses desenhos com a chapa de metal”, lembra ela, que também aplica tachas e placas de prata nas roupas de Herculano (Domingos Montagner) e Zóio-furado (Tuca Andrada).
Satisfeitas com o resultado de tantos meses de pesquisa e criação, Marie e Karla fazem questão de dizer que só chegaram ao figurino que desejavam porque contaram com um belo trabalho de equipe. “Fazer um bom trabalho dá muito trabalho. E o diferencial da equipe dessa novela é a dedicação”, elogia Karla, confessando que tem vontade de ver o figurino de “Cordel Encantado” fora da novela. “Adoraria fazer um livro com os figurinos. Quem sabe?”, conclui.